quinta-feira, 31 de maio de 2012

De vez em quando olhar é insuportável. De vez em quando a simpatia incomoda. O olhar soa falso, a simpatia soa falsa. E você se perde nos momentos em que se encontram. Ele sabe. Ela sabe. Não fomos feitos pro mesmo espaço. Ela tira a minha paciência, ela tira a minha paz. Ameaça o bom humor de um dia regado a um bom filme, uma boa bebida, uma boa companhia. Procura sustentar a conversa, entra pelas beiradas... invade espaços, ocupa pessoas... Noite adentro o corpo se contrai, noite adentro o excesso toma espaço. Em silêncio. Entre gritos de um sonho anterior observa os conflitos, aqueles últimos minutos em que fazia sentido confiar. Deixa-os sugarem expectativas, frustrarem a vantagem da calma, deixa de compreender, deixa a conversa ir rondando a vida de outras pessoas... Afinal, não importa, não tenho nada com isso, ele pode dizer. Duas pessoas. Três. Duas pessoas. O tempo encontra a medida certa da mudança. É hora de ir, hora do corpo dar espaço aos sentidos, hora de deixar a voz, de deixar os ouvidos perceberem as palavras corretas. Se o sentimento que sufoca transparece já é tarde demais, é tarde pra ter qualquer cuidado, é tarde pra pedir desculpas, é tarde pra falar qualquer coisa. Os dias avançam e você já não deseja ver, já não importa, nem lembra o som da voz. O telefone se perde da memória, as conversas já rasas desaparecem, e você não sente falta. Os meses avançam e o nome já perde lugar. A paciência é resguardada e uma história recomeça. - Nos conhecemos? - Acho que não. - Faz tanto tempo. Sussurra o nome ao ouvido. Finge lembrar, finge conhecer. Deixa o silêncio impregnar. Inventa uma desculpa qualquer e vai embora. A noite recomeça. Horas depois a memória carrega um sorriso pra você. Somos diferentes. Continuamos diferentes. O seu silêncio e a minha ausência são finalmente os nossos melhores lugares. Não porque precisem provar, falar... A paciência excessiva só lhes ajudou a corrigir seus próprios caminhos.

Múltipla

Me sinto dentro de uma historia da qual não faço parte. Como se tivesse surgido nesse corpo tarde demais. Não há nostalgia nisso, não me refiro só a épocas. Me refiro ao lugar, às pessoas. Não as conheço tão bem quanto imaginava, e elas não conhecem sequer um por cento de mim. Devem existir todas as palavras aqui. Eu devo ter todas as qualidades e todos os defeitos possíveis. Isso alimenta uma instabilidade com a qual ninguém consegue conviver por muito tempo, nem eu.

Susurros

Decidi não falar muito alto dessa vez, emendar um sussurro no outro, explodir esses sentimentos de pura incoerência. Acordando antes do sol, o deixando ir lhe banhando pelas frestas da janela até decidir levantar. Levantar para a vida que se abre tão lentamente, tão delicadamente. Seus passos caminham naquela mesma direção, naquele instinto que absorve os sentidos do ambiente. Sem pensar eles seguem. Tão devagar quanto pode, tão rápido quanto deve. Os instantes separam a noite do dia, de alguma forma também nos separam. Da junção deles podemos nos encontrar pelo meio do caminho. Esbarrar em uma rua comum, sorrir pelo canto da boca, fingir nossa intimidade, explicitar nossa distância. Alimentar. Alimentar o espaço que se forma entre nós. Torná-lo palpável, visível. Os que nos assistem já podem perceber a primeira vista, já não há mais nada. O pouco tempo fez curar.

Esquecimento adequado

A gente guarda com cuidado as pessoas que aparecem na nossa vida. A gente conhece de perto algumas delas. A gente se despede de outras. A vida vai seguindo com leveza, enquanto você aprende a estreitar e romper laços. Nesse momento, deixei uma pessoa ir. Me libertei de expectativas, de vontades. Ao mesmo tempo, o encontro com pessoas, mesmo fora do meu cotidiano, trouxeram uma luz que merece ser expandida. Dia a dia, dando tempo, deixando um pedaço delas guardadas por aqui. Deixaram sorrisos, agradecimentos, experiências, e uma saudade que cuida de ocupar tudo. O que se guarda é uma experiência que aflora os sentimentos mais conflitantes. Tem vontade de se aproximar, de se afastar. Tem vontade de deixar a vida respirar um tempo, enquanto você se recupera. Enquanto seu corpo, enquanto seu coração, ficam em sintonia pra lhe deixar em paz. Deixei o tempo me absorver. Deixei que ele me sustentasse durante esses dias. Somente ele. Alterno os dias em que me sinto suficiente. Alterno os dias em que os sorrisos ou a felicidade é sincera. Quero que o mundo, que essas pessoas, me deixem ir. Quero conseguir deixá-las. A tranquilidade não é fácil de ser assistida. Os pés e as mãos ficam inquietos, o sorriso e o olhar ficam passeando pelos lugares. Aqueles que lhe afligem a memória, aqueles que contam de si mais do que a voz. Perdeu-se entre os cuidados alheios. Procurou a simpatia escorregadia dos sentimentos alheios. Deixou-se naquele confuso mundo de outras pessoas. Existia para essas outras impressões. Essas... Essas com as quais não pode contar. Porque o tempo não foi suficiente para que se fizesse entender. E talvez nunca seja. Escorrega em direção à própria vida. De uma á outra respiração, corre prendendo, segurando o fôlego, alimentando esperanças frágeis que se dispersam na primeira busca sem resposta. Olhou pra tela. Olhou pras telas. Aquelas que ficam tentando usurpar a sua vida. Aquele mundo paralelo que lhe preenche em horário comercial, que lhe preenche pela madrugada adentro. Que lhe suga em tempo integral. E sem resposta a respiração pausa. Ela deita com o olhar diferente. Com o sorriso parado. Aquele que não reage mais. Aquele que se acostumou. Buscando um utópico estado de paz absoluto. Buscando isolar-se das multidões que vivem em sua cabeça.

Chamada

De volta pra casa ouvi um sussurro pelo caminho, de saudade, de amor. Daquele que falta... mas que, de certa forma, se faz mais presente que os dispersos ao meu lado. Somos parte de outras pessoas, não vou ficar me questionando sobre isso, somos. Todas as pessoas deixam um pouco nesse comportamento estranho, as vezes incompleto, cheio de incoerências e precipitações que temos diariamente. As vezes você chora sem muito sentido. Sente coisas sem muito sentido, na verdade, acho que as vezes criamos alguns sentimentos. Quase como uma mentira bem construída, propagada sob diversos pontos de vista, discutida... dessa forma esses sentimentos inventados quase tornam-se verdadeiros, ao ponto de doer. De parecer forte, resistente, alimentado pela ausência de sinceridade que se habituou a ter. boa parte deles foram todos assim. Foram construídos, lentamente, de onde não havia nada, cria-se um amor desesperado e incompleto... como todas as construções inadequadas, como todas as mentiras. Você acredita até o ponto de achar a verdade questionável. Mas é verdade que eu sinto falta. Sinto falta da cumplicidade de ter a vida exposta sem preocupações. Sinto falta de quem diz acreditar tanto que quase te convence, sinto falta de ser cuidada como uma menina perdida e dependente. Sinto falta de poder me deixar vulnerável sem ter medo. O tempo tem passado rápido. E inútil. Tem deixado todas as coisas inconclusas, confusas, estranhas, amargas, duras, e, principalmente, solitárias. Você aprende a descansar os olhos no chão. Aprende a conversar consigo mesma. Aprende a reconhecer o reflexo interior, aquele que o espelho não mostra, aquele guardado e lapidado diariamente, até que possa ser exposto. O reflexo desses sentimentos criados que fazem os dias se arrastarem. Que sugam o sorriso e o brilho dos olhos. Aquele que machuca. Aquele que não existe, além dessa porta que guarda o que mais importa em você.